terça-feira, 17 de abril de 2012

SÍNCOPE/SÍNDROME VASOVAGAL

Síncope Vasovagal e Teste de Inclinação ("Tilt-Test")




RESUMO:
A síncope é um sintoma comum e até recentemente sua etiologia não era estabelecida em cerca de 45% dos casos. Acredita-se que cerca de 55% dos casos de síncope sejam decorrentes de reflexos mediados pelo sistema nervoso, do tipo vasovagal. Difundiu-se recentemente a aplicação do teste de inclinação ("tilt-test") para confirmação diagnóstica. Entretanto, protocolos distintos têm sido utilizados e os resultados encontrados classificados de diversas formas, o que tem dificultado a comparação dos achados de diferentes serviços. A presente revisão da literatura tem por objetivo discutir a fisiopatologia da síncope vasovagal, os vários protocolos de teste de inclinação utilizados para o seu diagnóstico, assim como a posição ideal deste método complementar dentro de um algoritmo racional de avaliação de síncope.



INTRODUÇÃO 

A síncope é definida como a perda súbita e transitória da consciência, associada à perda do tônus postural, com recuperação espontânea, sem a necessidade de cardioversão química ou elétrica1. Representa um sintoma comum e que freqüentemente leva pacientes a uma avaliação cardiolóqicas2. Nos EUA, a síncope é responsável por 1 a 6% das internações em hospitais gerais e por 3% de todos os atendimentos em serviços de ernerqência3-5. A perda da consciência tem sido relatada em 12 até 48% de adultos jovens hígidos, embora muitos não procurem assistência médica1. Face a importância do sintoma síncope, muito esforço tem sido feito nos últimos anos para melhor compreender seus diversos mecanismos fisiopatológicos e fatores desencadeantes, assim como desenvolver uma abordagem diagnóstica mais racional. É nesse contexto que consideramos oportuna a presente revisão acerca de um tipo muito freqüente de síncope, a vasovagal, enfatizando sua fisiopatologia, seu quadro clínico, assim como o método complementar atualmente utilizado para o seu diagnóstico, o teste de inclinação. Com relação ao teste de inclinação pesquisaremos a importância no diagnóstico e tratamento da síncope vasovagal, os diferentes protocolos utilizados, as diferentes classificações das alteraçoes encontradas, e a posição ideal deste método dentro de um algoritmo racional de avaliação das síncopes. 


ETIOLOGIA DAS SíNCOPES 

A perda da consciência pode resultar de um amplo espectro de anormalidades cardiovasculares e não cardiovasculares, conforme evidencia a classificação convencional utilizada por Kapoor1. A maioria dos episódios sincopais pode ser enquadrada dentro do grupo cardiovascular, embora tenham fisiopatologia e prognóstico diversos. No sentido de melhor agrupar as diversas causas de síncope, Benditt3 propôs uma classificação que as reúne em 6 categorias diagnósticas. A Tabela I apresenta tal classificação, a qual acrescentamos pequenas modificações. 




A síncope vasovagal, que envolve reflexos mediados pelo sistema nervoso, é tida como responsável por mais de 55% dos casos de síncope1. Tem sido referida na literatura através de farta terminologia: síncope "vasovagal", "vasodepressora", "mediada pelo sistema nervoso", "neurocardiogênica", ou mesmo "desmaio cornum"6. Os termos vasovagal e neurocardiogênica têm sido empregados com maior freqüência. Embora a síncope vasovagal seja usualmente considerada uma desordem de caráter e prognóstico benignos, casos relatados na literatura demonstram que às vezes podem ocorrer assistolias prolongadas com manifestações muito graves, até mesmo a morte7-10. Maloney et al.7 propuseram o uso do termo "síncope vasovagal maligna" para designar esses casos. 


FISIOPATOLOGIA DA SÍNCOPE VASOVAGAL 

O teste de inclinação utiliza os conceitos fisiopatológicos da síncope vasovagal, tornando-se portanto fundamental uma revisão sobre este assunto. 

Em condições fisiológicas a mudança rápida do decúbito horizontal para a posição ortostática resulta num represamento de sangue (500 a 700 ml em um adulto) na circulação venosa dos membros inferiores e região esplâncnica, diminuindo o retorno venoso ao coração. Como conseqüência, há uma tendência à diminuição do volume diastólico final, do volume sistólico e da PA, ativando-se os barorreceptores aórticos, carotídeos, cardiopulmonares, o sistema renina-angiotensina-aldosterona e liberando-se vasopressina1. Reflexamente ocorre aumento da estimulação simpática e diminuição da parassimpática e, como efeitos finais, taquicardia e aumento da PA diastólica, com diminuição discreta da PA sistólica11. Essa é a seqüência já conhecida dos fenômenos que ocorrem nas pessoas normais ao assumirem a posição ereta. 

A seqüência exata dos fenômenos no indivíduo que apresenta síncope vasovagal ainda não é completamente esclarecida12. Existem evidências de aumento da estimulação simpática e diminuição da parassimpática antes da perda da consciência1, fase em que ocorre aumento da PA e da frequência cardíaca. Aumentos nas concentrações urinárias e sangüíneas de epinefrina e norepinefrina tem sido relatados imediatamente antes da slncope13. Esses achados sugerem que um aumento na atividade adrenérgica possa ter participação no desencadeamento da síncope vasovagal(1). Tem sido postulado que crianças e adolescentes portadores de síncope vasovagal possuem uma hipersensibilidade beta-adrenérqica14. De qualquer forma, acredita-se que um aumento na atividade simpática cardíaca na presença de um enchimento ventricular reduzido (retorno venoso diminuido) gere um importante aumento na força de contração ventricular e que este, por sua vez, provavelmente seja o mecanismo de estimulação indevida dos mecanorreceptores cardíacos (fibras-C)1,12. Estes receptores, localizados principalmente, nas regiões posterior e inferior do ventriculo esquerdo, seriam ativados através do estiramento somente em situações de hipertensão ventricular importante12,15. A estimulação dos mecanorreceptores cardíacos produz um aumento paroxístico na descarga nervosa aferente para o trato solitário da medula, gerando paradoxalmente diminuição do tônus simpático, aumento do parassimpático e conseqüentemente hipotensão arterial e/ou bradicardia (reflexo de Bezold Jarisch), eventualmente com síncope15-17. Certamente existem receptores de diferentes tipos localizados em vários outros órgãos capazes de gerar semelhante descarga nervosa aferente para a medula e síncope vasovagal(3). Isso é evidenciado através do relato de síncope vasodepressora em pacientes com coração transplantado13, sabidamente denervado. Dentro dessa linha de raciocínio, poderíamos dizer que todas aquelas síncopes causadas por hipotensão arterial e/ou bradicardia, mediadas por reflexos do sistema nervoso autônomo, seriam diferentes entre si apenas com relação aos "receptores desencadeantes" e a maneira pela qual o sistema nervoso central recebe e processa a descarga nervosa aferente desses receptores3. 

O episódio sincopal pode ser desencadeado por um estresse emocional ou físico que aumenta a produção de catecolaminas e posteriormente estimula os mecanorreceptores cardíacos, ou mesmo por ativação direta pelo córtex do sistema nervoso central18, sem que o paciente esteja necessariamente na posrçao ereta e sem que haja qualquer diminuição do retorno venoso para que se desencadeie o processo. Além disso, estudos realizados com ultrassonografia doppler transcraniana demonstraram existir, paradoxalmente, vasoconstrição arterial cerebral durante a síncope vasovagal induzida por teste de inclinação19-21. Acredita-se que isso possa resultar em hipoperfusão cerebral e contribuir de forma significativa para os mecanismos desencadeantes da síncope vasovagal. Finalmente, após todas essas ponderações, concluímos que a fisiopatologia da síncope vasovagal resulta de um arco-reflexo relativamente complexo, com algumas vias atualmente mais esclarecidas, envolvendo o sistema nervoso autônomo, assim como outras áreas do sistema nervoso central. As pessoas acometidas por essa síncope provavelmente apresentam uma disfunção autonômica representada, por exemplo, por uma hipersensibilidade localizada em algum ponto ("receptor") desse arcoreflexo. Em situações especiais e transitórias ("gatilhos"), ocorre o desencadeamento paroxístico e paradoxal da resposta hipotensora e/ou bradicardizante. 


DIAGNÓSTICO DA SíNCOPE VASOVAGAL 

Freqüentemente se diz que a combinação de uma anamnese e um exame físico bem realizados permite orientar o diagnóstico em aproximadamente 60% dos casos3. É necessário entretanto que se confirmem as hipóteses diagnósticas para se estabelecer com segurança o prognóstico e a terapêutica adequada. Estudos realizados nos anos 80 demonstraram que a etiologia não era estabelecida em até 45% dos casos de síncope4. Aventou-se a hipótese de que grande parte desses pacientes poderia ter síncope vasovagal, sem entretanto ser possível confirmar o diagnóstico na época. Para diagnosticar a síncope vasovagal desenvolveu-se o teste de inclinação conhecido como "head-up tilt testing", "upright tilt testing", ou simplesmente "tilt-test" da literatura inglesa15-16. Este teste utiliza os conceitos fisiopatológicos da síncope vasovaqal(15). 


MANIFESTAÇÕES CLíNICAS 

A síncope vasovagal caracteriza-se por uma queda súbita na PA, freqüentemente acompanhada de bradicardia e manifestações autonômicas e humorais, tais como palidez, náusea, sudorese, midríase, hiperventilação1. Em alguns pacientes podem ocorrer movimentos tônico-clônicos semelhantes aos da convulsão epiléptica12. A síncope freqüentemente é desencadeada por um "gatilho" representado por uma situação de estresse emocional importante, medo, angústia ou dor. São fatores predisponentes: punção venosa, doação de sangue, calor, ortostatismo prolongado, fadiga, cirurgia dentária, cirurgia oftalmológica, exame ginecológico e exame de próstata(1,6). Segundo Engel(22), a síncope vasovagal tende a ocorrer com mais frequência quando associam-se as seguintes condições: 1 - estresse ou dor não familiar para a pessoa, ou aqueles previamente vivenciados, porém não suportados e 2 - situações nas quais esperase um comportamento de coragem ou serenidade. 


O TESTE DE INCLINAÇÃO 

Há muitos anos os fisiologistas já vêm utilizando a inclinação passiva dos pacientes para provocar um estresse ortostático e estudar mecanismos de adaptacão às mudanças de posição e postura11. Durante um desses estudos, Stevens, Fazekas23 observaram que alguns pacientes desenvolviam hipotensão arterial e bradicardia seguidas de perda da consciência. Posteriormente, ficou claro que a inclinação prolongada representava um estímulo ortostático intenso capaz de promover um represamento venoso máximo nas partes inferiores do corpo e, reflexamente, um aumento da estimulação simpática e da força de contração ventricular, induzindo em seguida a síncope vasovagal em indivíduos predispostos12. Entretanto, somente em 1986 Kenny et al.24 introduziram a metodologia na avaliação da síncope de etiologia desconhecida. Desde então, vários pesquisadores têm publicado trabalhos demonstrando a utilidade do teste de inclinação na identificação de pacientes predispostos a desenvolver hipotensão e/ou bradicardia do tipo vasovaga1(20,24-36). 

A metodologia empregada, assim como os resultados obtidos, têm variado bastante entre os autores, embora existam pontos consensuais. Tem sido preconizada a realização do teste em ambiente calmo e com luzes claras, de preferência pela manhã, para que não haja influência da variação diurna sobre o tônus autonômico, com o paciente em jejum desde a noite anterior. Toda medicação vasoativa ou cardioativa deve ser suspensa por no mínimo 5 dias antes do estudo31,35. 

O exame é iniciado colocando-se o paciente em decúbito dorsal horizontal sobre uma mesa inclinável com plataforma para apoio dos pés e cinto de segurança no tronco. É estabelecido um acesso venoso e o paciente é observado nesta posição por 10 a 20 minutos, sendo monitorizado o eletrocardiograma (ECG) e a PA 4,7,25,27. A PA pode ser monitorizada preferencialmente de forma não invasiva, podendo ser contudo invasiva1. Após este período, inicia-se a inclinação passiva do paciente elevando-se a cabeceira da mesa, monitorizando-se o ECG e a PA. O ângulo de inclinação empregado tem variado de 40º a 90º, sendo que nos testes passivos (sem isoproterenol) o ângulo de 60º é o mais utilizado15. Já nos testes sensibilizados com o isoproterenol, o ângulo mais comumente utilizado é o de 80º(15). O tempo de inclinação tem variado de 10 a 60 minutos, sendo comumente de 60 minutos nos testes passivos e de 10 a 30 minutos nos testes com isoproterenol(15). No teste sensibilizado com isoproterenol, após uma fase de inclinação passiva negativa, segue-se um período de 5 a 10 minutos de decúbito horizontal durante o qual inicia-se a infusão da droga 15. Na maioria dos estudos a dose inicial de isoproterenol tem sido de 1 µg/min sob infusão contínua, sendo o paciente mantido em inclinação por 10 a 30 minutos(6,20,26,27,30,31). Depois deste período, caso não ocorra alteração, alguns autores recomendam que o paciente seja recolocado em decúbito horizontal, e a dose de isoproterenol aumentada em 1 µg/min, repetindo-se então a manobra de inclinação anterior. O teste é repetido, segundo alguns autores, até uma dose máxima de 3 a 5 l µg/min, devendo ser interrompido em qualquer fase se o paciente apresentar síncope/pré-síncope isoladamente ou em associação com bradicardia e/ou hipotensão. A mesa deverá ser rapidamente retornada para a posição horizontal quando o resultado do teste for positivo 15,35,37, 

O paciente deverá permanecer monitorizado até que as alterações hemodinâmicas e eletrofisiológicas retornem ao normal, o que geralmente acontece espontaneamente em poucos minutos, Raramente poderá ser necessário aplicar manobras de ressuscitação cardiorrespiratória, motivo pelo qual o teste deve sempre ser realizado em ambiente com recursos suficientes para o atendimento de uma eventual parada cardiorrespiratória, Entretanto, não têm sido relatadas complicações durante o teste de inclinação passivo. Complicações tais como dor precordial, taquicardia (FC> 150pm), crise hipertensiva e taquiarritmia atrial têm sido relatadas com a infusâo de isoproterenol. Não houve relatos de infarto do miocárdio, taquicardia ventricular ou mortes durante o teste 15,37, 

Segundo Samoil, Grubb38, os padrões de resposta encontrados durante o teste de inclinação podem ser de 3 tipos (Tabela II). 




De acordo com as alterações observadas na PA e FC, recentemente o Grupo de Estudo Internacional de Síncope Vasovagal ("VASIS") propôs uma classificação dos diferentes tipos de resposta vasovagal (Tabela III)39. 




Segundo Benditt3, a maioria dos pacientes apresenta a resposta mista, alguns a cardioinibidora, sendo rara a resposta vasodepressora pura. Estudos realizados em nosso meio40-45 relatam diferentes freqüências relativas para cada tipo de resposta vasovagal. Acreditamos que a utilização de diferentes critérios para a classificação dos tipos de resposta vasovagal e o número relativamente pequeno de pacientes estudados explica as divergências entre esses estudos, Em nossa experiência inicial (ainda não publicada) no setor de arritmia e marcapasso do Hospital Universitário-U.F.J.F., utilizando-se a classificação proposta pelo "VASIS", encontramos percentuais de tipos de resposta vasovagal compatíveis com os da literatura internacional, ou seja, 64% do tipo 1 mista, 27% do tipo 2 cardioinibidora (2A-18%, 2B-9%) e 9% do tipo 3 vasodepressora. 


DISCUSSÃO 

Quando indicar o teste de inclinação? 


Na prática médica, a síncope vasovagal é usualmente diagnosticada a partir de uma história clínica sugestiva, afastadas outras possibilidades de síncope (diagnóstico de exclusão)46. Entretanto, muitas vezes o quadro clínico não é característico e o teste de inclinação pode ser de grande utilidade para a confirmação do mecanismo vasovagal ou para o estudo de outros distúrbios do controle da PA. Portanto, as atuais indicações para o teste de inclinação são as seguintes: 1- Avaliação de pacientes com síncopes ou pré-síncopes recorrentes de origem indeterminada (principal indicação), em que o teste parece ser útil na identificação da síncope vasovagal em mais de 70% dos pacientes12,26,30,35,36. 2- Diagnóstico diferencial entre "síncope convulsiva" (síncope vasovagal seguida de convulsão) e epilepsia propriamente dita, nos casos de crise convulsiva de etiologia obscura com EEG de repouso normal47 (registros do EEG durante o teste de inclinação na síncope convulsiva demonstraram desaceleração difusa da atividade elétrica, compatível com hipóxia cerebral, ao invés da hiperatividade com ondas apiculadas presentes nas crises epilépticas verdadeiras), 3- Avaliação de síncopes ou pré-síncopes recorrentes relacionadas a exercícios e em atletas, 4- Diagnóstico diferencial de hipotensão postural, 5- Sensibilização da manobra vagai para diagnóstico de hipersensibilidade do seio carotídeo na forma vasodepressora, e 6- Documentação da resposta terapêutica em pacientes com diagnóstico de síncope vasovagal já estabelecidos6,31. 

No sentido de sistematizar a abordagem diagnóstica de pacientes portadores de síncope(s), Kapoor1,6 sugere um fluxograma de avaliação, o qual reproduzimos com pequenas modificações (Figura 1). É importante ressaltar que, após a anamnese, o exame físico e o ECG, caso não se tenha o diagnóstico etiológico da síncope e não exista suspeita de doença cardiológica/pulmonar estrutural ou neurológica/vascular cerebral como causa direta, o quadro vasovagal deverá ser a primeira hipótese em pacientes com coração e ECG normais, sendo o teste de inclinação o primeiro exame a ser realizado. Se o paciente apresentar cardiopatia (coronariopatia, cardiomiopatia, etc) ou ECG alterado (bloqueio de ramo, etc,) a investigação deverá inciar-se pelo ECG dinâmico (Holter), sendo o teste de inclinação um dos últimos exames da seqüência diagnóstica, caso os anteriores não tenham sido elucidativos. 




Qual protocolo utilizar para o teste de inclinação? 

Após revisão da literatura, Kapoor15 propôs recentemente que se utilizasse a inclinação de 60º por 45 a 60 minutos, sem o uso de isoproterenol. Argumentou que os determinantes principais da resposta positiva parecem ser o ângulo da inclinação e a duração da mesma. Nos estudos que usam isoproterenol, com ângulo de inclinação de 60º a 90º, a porcentagem média de testes positivos em pacientes com síncope de origem desconhecida é maior com ângulos maiores. Os estudos que usam ângulos de 60º por 60 minutos mostram porcentagens quase idênticas de testes positivos, quer utilizem ou não o isoproterenol(15). Trabalhos recentes questionam os efeitos do isoproterenol na estimulação da síncope vasovagal, uma vez que as altas taxas de respostas positivas relatadas com o uso deste agente podem se dever aos ângulos maiores empregados nesses testes e/ou à maior duração dos mesmos15. Essa droga pode levar a complicações durante a fase de infusão especialmente quando utilizada em pacientes cardiopatas15: Na realidade, a sensibilidade do teste de inclinação, definida como a proporção de pacientes com síncope vasovagal conhecida que apresentam o teste positivo, não pode ser adequadamente estudada pois o único padrão-ouro conhecido é o diagnóstico clínico desta desordem. Estudos realizados em pacientes com diagnóstico clínico de síncope vasovagal mostraram sensibilidade (na realidade "positividade") de 67% a 83% com o uso de isoproterenol(15). Em pacientes com síncope de origem desconhecida, têm sido relatadas positividades médias de 49% e 64% para os testes passivo e com isoproterenol, respectivamente1. 

Se por um lado a sensibilidade é de difícil avaliação, pela falta de um padrão-ouro, por outro a especificidade pode ser facilmente avaliada aplicando-se o teste em indivíduos normais (sem síncope). O conhecimento da especificidade dos diferentes protocolos para realização do teste de inclinação é de fundamental importância antes da confirmação diagnóstica da síncope vasovagal e do início de um tratamento prolongado ou para avaliar a eficácia do mesmo através de testes seriados48. Em revisão da literatura, Kapoor et al.15 demonstrou que a especificidade média para os protocolos passivos com ângulos de 40 a 70º é de 92,5%, reduzindo-se para 73% nos protocolos que utilizam isoproterenol e ângulos de 60 a 80º. Mais recentemente, num importante estudo, Natale et al.48 avaliaram de forma randomizada indivíduos normais com relação à resposta a diferentes ângulos de inclinação e a diferentes doses de isoproterenol. Os autores concluiram que a especificidade é adequada quando se utilizam ângulos de 60 e 70º, sendo de 92% nos testes passivos (sem isoproterenol) e de 88% nos testes com isoproterenol em baixas doses (1 µg/min aumentadas gradualmente até elevar a freqüência cardíaca basal em pelo menos 20%). Ângulos de 80º por mais de 10 minutos ou a utilização de altas doses de isoproterenol (3 e 5 µg/min) reduziram de forma significativa a especificidade do teste. 

A reprodutibilidade imediata ou tardia do método variou em quatro estudos realizados de 71 a 85%, com média de 78%(15). 

A revisão da literatura permite concluir que o protocolo a ser utilizado deverá ter ângulo de inclinação de 60º com duração de pelo menos 45 minutos (2 desvios-padrão maior que o tempo médio de positivação do teste que é de 24 min.)29, sendo aceitável a utilização de isoproterenol em dose baixa (1 µg/min aumentada gradualmente até a elevação da freqüência cardíaca basal em pelo menos 20%), com o intuito de se aumentar a positividade sem reduzir significativamente a especificidade, nos casos em que o teste passivo for negativo. 

Qual o tratamento da síncope vasovagal? 

O tratamento da síncope vasovagal deve ser individualizado de acordo com a necessidade de cada paciente, face a grande variação na severidade de suas rnanitestações38. O tratamento consiste basicamente de orientação para a prevenção das síncopes, medidas não farmacológicas, medicamentos e restrições a determinadas atividades que colocam em risco o paciente e/ou terceiros1. 

Quando os episódios de síncope são pouco freqüentes e ocorrem apenas em circunstâncias excepcionais, a principal terapia é a orientação do paciente sobre o seu problema, para que este evite os fatores predisponentes e assuma a posição supina por 15 a 30 minutos sempre que ocorrerem os sintomas prodrômicos1,12. 

Entretanto, em alguns pacientes faz-se necessária a farmacoterapia profilática, quando as síncopes se tornam recorrentes e irnprevisíveis1,12. Os betabloqueadores, como o metoprolol em doses de 50 a 200 mg/dia, são freqüentemente utilizados devido ao seu efeito inotrópico-negativo, que diminui a força de contração do ventrículo e impede a ativação dos mecanorreceptores cardíacos1. Há vários estudos mostrando eficácia de outros beta-bloqueadores, tais como propranolol, na dosagem de 40 a 160 mg/dia(1,49), o atenolol, 25 a 200 mg/dia(1,50) so e o pindolol51. Embora existam relatos de agravamento da síncope com o uso desses fármacos1, de um modo geral os beta-bloqueadores são bem tolerados e eficazes na sua prevenção6,15,38. 

Outras opções de tratamento preventivo incluem a dieta rica em sódio e o uso de meias-calças de compressão gradual, úteis por promoverem a expansão de volemia1. Por sua ação expansora de volume aumentando a pré-carga, a hidrofluorocortisona (mineralocorticóide) na dose de 0,1 a 1 mg/dia, é a uma terapia eficaz principalmente em crianças1,6,15,38. Seus efeitos colaterais possíveis são a hipertensão arterial, a retenção de líquidos, a insuficiência cardíaca e a hipopotassernia1. A disopiramida (200 a 600 mg/dia) possui efeito anticolinérgico e inotrópiconegativo(1,6,15,38). A escopolamina transdérmica (1 adesivo cutâneo de 0,5 mg de 3/3 dias) possui ação moduladora sobre o tônus autonômico e ação vaqolítica15,31. Pelo fato de ter um considerável efeito anticolinérgico central esta droga com freqüência provoca efeitos colaterais, como tonturas e náuseas 52. A teofilina oral (6 a 12 mg/Kg/dia) tem sido relatada como eficaz em alguns pacientes, mas o seu mecanismo de ação ainda não está bem estabelecido6,38. Postula-se um efeito bloqueador da adenosina que tem ação vasodilatadora1. Mais recentemente, o c1oridrato de fluoxetina tem sido usado com bons resultados para prevenir síncopes recorrentes em pacientes que não toleram outras terapias convencionais, seu mecanismo de ação parece ser por inibição da recaptação de serotonina6,38. Experiências favoráveis também têm sido relatadas com a efedrina, a etilefrina, a diidroergotamina, a pseudoefedrina e a midodrina1,53. 

O implante de marcapasso (MP) tem sido indicado em pacientes refratários à terapia medicamentosa ou portadores de síncope vasovagal maliqna1,54 , embora a sua indicação seja controversa como terapêutica única8,24,55,56, pois a reação vasodepressora continuará presente. O MP pode melhorar os sintomas ao evitar a bradicardia responsável pela piora da hipotensão1. Deve ser utilizado em associação com a terapêutica farmacológica de escolha1. Dá-se preferência ao MP de dupla-câmara porque a manutenção do sincronismo atrioventricular durante os episódios de bradicardia melhora o enchimento ventricular e o débito cardíaco evitando a resposta vasodepressora aumentada pelo estiramento dos receptores atriais durante uma contração atrial concontra
as valvas AV fechadas no caso de ausência de sincronismo AV 6,8,33,54.

Após o trabalho de Brignole et al.57 ter demonstrado pequenas taxas de recorrência de síncope, com boa evolução e livre de complicações, tanto no grupo com medicamentos (atenolol, cafedrina, diidroergotamina, domperidona) quanto no grupo com placebo, existem preocupações com relação à eficácia dos tratamentos preventivos de síncope vasovagal. Certamente esta é uma área parafuturas investigações. 


CONCLUSÃO 

O teste de inclinação ("tilt-test") é um método complementar que recentemente trouxe grandes benefícios na propedêutica da síncope de origem indeterminada, entre outras indicações. Deve-se lembrar que a história clínica, o exame físico e o ECG convencional são os métodos iniciais mais importantes na avaliação de um episódio de síncope, seguidos por exames complementares solicitados em função da suspeita clínica. A utilização de um algoritmo racional de avaliação de síncope pode tornar a investigação menos onerosa, mais rápida, e conseqüentemente mais eficiente. 

Faz-se necessário que haja ampla discussão e padronização nos protocolos de realização do teste, assim como na classificação dos resultados encontrados para que os achados dos diferentes autores possam ser comparáveis. Foi objetivo desta revisão favorecer a discussão crítica neste sentido.
 


TILT TEST

COMO É FEITO O TILT TEST?

O Tilt Test (Teste Inclinado) é um procedimento diagnóstico em que o paciente é colocado em uma maca apropriada com suporte para os pés, sendo monitorizados o traçado eletrocardiográfico, a pressão arterial e os sintomas clínicos.

Após um período de repouso de 10 minutos a zero grau, a maca é, então, inclinada a 60 graus (a cabeça fica para cima, nunca fica de ponta-cabeça!) durante 25 minutos. Caso não ocorram sintomas, ministra-se uma dose baixa de Isordil via sublingual e o exame é estendido por mais 25 minutos.

O exame é interrompido caso ocorram sintomas, quedas de pressão arterial e/ou freqüência cardíaca.



COMO SÃO INTERPRETADOS OS RESULTADOS?

O Tilt Test é considerado “positivo” para síncope vaso vagal quando ocorrem sintomas sincopais acompanhados por queda da pressão e/ou da freqüência cardíaca.

Além disso, outras alterações potencialmente consideradas causadoras de síncopes podem ser detectadas pelo exame.

São elas: 

          - Disautonomias - queda de pressão arterial nos primeiros minutos após a inclinação desacompanhada do aumento nos batimentos cardíacos. 
          - Hipotensão Ortostática - queda de pressão arterial acompanhada de elevação de freqüência cardíaca. 
          - Síndrome da Taquicardia Postural Ortostática - elevação de freqüência cardíaca superior a 120 bpm ou mais de 30 bpm em relação ao repouso, após a inclinação (sem queda de pressão arterial).
          - Hipersensibilidade do Seio Carotídeo ? queda superior a 50 mmHg de pressão arterial sistólica ou bradicardia interna após massagem do seio carotídeo.

Respostas negativas:

          - Ausência de quaisquer dos eventos acima citados.

RISCO DO EXAME

O exame é, em geral, bem tolerado. Não há registros de morte durante sua realização.

Contudo, o teste pode desencadear desmaios, vômitos, abalos musculares momentâneos, mal estar e dor de cabeça (todos temporários!).

UTILIDADE DO MÉTODO

Como os desmaios são episódicos, imprevisíveis e de múltiplas origens, a certeza quanto à causa de síncope reveste-se de fundamental importância para instituir-se um tratamento apropriado e determinar o prognóstico (risco).

Dessa forma, pacientes com síncopes devem procurar atendimento com médico familiarizado com a doença, devendo-se imediatamente descartar ou não a presença de cardiopatia estrutural e/ou arritmia.

Distúrbios neurológicos avançados, como doença de Parkinson, por exemplo, devem ser observados.

Na ausência dessas enfermidades, a causa mais comum de síncope é a vaso vagal (neurocardiogênica, reflexa ou neuro-mediada).

Ela é uma alteração no sistema nervoso autônomo em que, mediante alguns estímulos (ficar em pé durante muito tempo, ver sangue, stress, tosse, etc) ocorre uma queda acentuada na pressão arterial e/ou da freqüência cardíaca gerando um colapso circulatório cuja apresentação clínica é um desmaio.

É uma condição comum, benigna, porém frequentemente recorrente ocasionando apreensão no paciente e na família, e geralmente consumindo muitos recursos financeiros e emocionais durante sua investigação.

O Tilt Test é o exame que consegue desencadear, no laboratório, este tipo de síncope em indivíduos suscetíveis, facilitando assim o seu diagnóstico


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